quarta-feira, 26 de outubro de 2005

Ensino “muito pouco” Especializado da Música (5)

Coloquem alguém de forma permanente e obstinada a fazer aquilo que não sabe nem gosta. Ou ainda pior, coloquem pessoal não especializado a “fazer de conta que faz” o trabalho especializado. É, como se dizia num post abaixo, querer “endireitar a sombra da vara torcida” colocando o pedreiro a fazer o trabalho do engenheiro. Os maus resultados aparecem, mais cedo ou mais tarde, de forma mais ou menos radical. Assim vai o ensino “nada” especializado da música em Portugal.
8 Comments:
At Quarta-feira, 26 Outubro, 2005, Nívea Samovar said...
Pois...
Imagino que hoje te puseram mais uma vez a partir pedra burocrática...
Compreendo o tormento.
Assim nem podes ter disponibilidade mental para compor algo à tua filha que não a ponha a falar de trás para a frente ou muda durante 4 minutos e 33 segundos quando tentas adormecê-la...
Não vislumbro solução mas... estou contigo!

At Quinta-feira, 27 Outubro, 2005, IO said...
A música faz parte da educação completa que todo o cidadão devia ter, mas como educação é coisa de que o(s) governo(s) temem, natural é o estado em que nos encontramos em Portugal - abraço, IO.

At Quinta-feira, 27 Outubro, 2005, Carlos a.a. said...
Estimado Paulo Bastos
O alcande deste texto é vastíssimo e daí a sua riqueza: tanto podemos ler a falta de propensão ou qualidade do ensino especializado da música como a apetência de alguns músicos para a área da gestão...
Cumprimentos

At Quinta-feira, 10 Novembro, 2005, pisconight said...
A música é uma arte, é um dom, faz parte da nossa cultura e faz-me um bem imenso (a mim!!).
;)

At Terça-feira, 22 Novembro, 2005, César Viana said...
Penso que uma grande parte do problema reside no facto de o ensino das artes ter sido integrado na estrutura do ensino regular, sem que tenha havido a necessária flexibilidade para que a sua especificidade pudesse impor algumas necessárias excepções. Os métodos de selecção para os cursos superiores (e a necessidade de preecher vagas) fazem com que cada geração seja necessariamente mais ignorante e irrelevante que a anterior; o tipo de carreiras do ensino secundário impede o acesso dos mestres e promove os professores de carreira, que deveriam ministrar o ensino artístico genérico nas escolas (de que falo? Isso existe lá...). Trata-se de situações que criam cadeias irremediáveis que já nos envolveram. Não sei se há como sair daqui, tendo em conta o que é o enquadramento legislativo, o funcionalismo provinciano de grande parte dos docentes, e os milhões de futuros setôres de música a serem (de)formados permanentemente. E, no fundo, o problema é simples: há artistas e há jovens que aspiram a sê-lo... mas o enquadramento legal, que seguramente alimenta carreiras e protagonismos, só não deixa espaço para mestres e discípulos.

At Terça-feira, 22 Novembro, 2005, nívea samovar said...
Concordo plenamente com a clara análise que o César Viana acabou de fazer. É lamentável que assim seja, ou que aqui se tenha chegado. A uma situação em que, para nos realizarmos como mestres ou discípulos, nos vejamos forçados a afastar-nos do enquadramento educacional que supostamente deveria ter como principal função promover essa relação de aprendizagem. Pergunto-lhe, César: acha que o ensino das artes perdeu em ter sido enquadrado num ensino regular, em toda a Europa, ou este é mais um caso português de modelos de ensino onde a rigidez do esteriotipo atrofia os verdadeiros objectivos ou mesmo os esvazia de conteúdo?
Estou errada ou as escolas secundárias de outras artes não tiveram a mesma evolução negativa?
Por último, RE-benvindo a este espaço dialogal! Pode ser que o Paulo, entre o braço direito encalhado, a defesa de tese e os afazeres familiares, seja estimulado a voltar!

At Quinta-feira, 24 Novembro, 2005, César Viana said...
Noutros países da Europa, apesar da integração na rede oficial de ensino, foi respeitada a especificidade deste tipo de ensino no que diz respeito a curriculum, carga horária, recrutamento de professores, etc. embora o final o diploma seja equivalente. É verdade que noutras artes o problema não é tão sério. Onde ele é verdadeiramente gritante é na música e, talvez mais dramaticamente ainda, na dança, já que os escalões etários dos discentes, o tipo de progressão, a origem dos docentes, etc. têm características muito diferentes. Em ambas se começa muito cedo a estudar e, também, a construir uma carreira. Em ambos os casos seria importante que os docentes fosem oriundos do meio artístico, pelo menos os de certas disciplinas mais vocacionais, e em estabelecimentos de ensino de referência. Em certos países, paralelamente a um ensino artístico mais integrado no sistema regular, subsiste um outro, ligado a instituições artísticas (caso da Opéra, por exemplo). Noutros casos ainda, não há qualquer tipo de integração nas redes regulares de ensino. Não me parece que haja receitas milagrosas. Com sistemas muito diferentes no que diz respeito ao grau e tipo de integração no ensino regular, há muitas experiências positivas. A questão acaba sempre por ter a ver com flexibilidade e bom senso. Acontece que é muito mais fácil para a gigantesca máquina burocrática do Ministério da Educação achar que é tudo igual e pronto. Daria talvez mais trabalho encontrar formas de equivalências de habilitações para adocência, diferentes estruturas curriculares e cargas horárias, etc. Repare-se que não é uma questão legal.
Há no entanto que dizer que não tem sido fácil encontrar posições consensuais nestas matérias. Em países como a Inglaterra, a França, a Alemanha, etc. há uma tradição que trava os excessos de corporativismo. Em Portugal, o peso das questões corporativas tem-se sobreposto frequentemente a um esforço genuíno para resolver estas questões tendo como ponto de partida a formação dos alunos e não os problemas laborais dos professores. É claro que estes têm de ser sempre respeitados, mas sempre que se desenham novas estratégias, sente-se que os numerosos calculismos que despontam têm muito a ver com carreiras e pouco com arte e ensino.

At Domingo, 27 Novembro, 2005, sasfa said...
Já há muito tempo que não via uma tão boa descrição como a que faz o César Viana; é mesmo isso, é tudo isso! É um texto acertadíssimo! Mas, inesperadamente, em vez de responder com alvoroço, alguma revolta até, fico um pouco paralizada à frente do computador...
Devo estar cansada de ver o barco a afundar e ainda estar dentro dele...

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