sexta-feira, 30 de março de 2007

Texto (2)

“Debussy era extremamente meticuloso e preciso nas suas indicações musicais (…) mas há três ítems em que ele confiava no bom senso e na inteligência musical do intérprete: dedilhação, pedal e tempo."
Dunoyer, Cecília,
Debussy in Performance, New Haven, Yale Universiry Press, 1999

Os problemas relativos ao tempo e à indicação de compasso no prelúdio La Cathédrale Engloutie foram já amplamente discutidos e estudados por pianistas, críticos e musicólogos. O facto é que, quando Debussy escreveu este prelúdio não incluiu a alteração de tempo mínima = semínima em duas secções da peça (compassos 7 a 12 e 22 a 83), alteração essa que ele próprio faz enquanto intérprete na gravação em piano de rolo de 1913.
A questão do prelúdio La Cathédrale Engloutie espelha perfeitamente a problemática em torno valor do texto e da performance no conceito de obra musical. É inegável a importância da gravação de Debussy, no sentido em que veio esclarecer não só um problema de interpretação, mas também as próprias intenções do compositor, que teriam ficado pouco explícitas no texto; mas, também é inegável que ainda agora se continua a tocar, e a gravar, este prelúdio com base somente na partitura, ignorando, ou desconhecendo, por completo as intenções do compositor explícitas pela sua própria performance. Por outro lado, a alteração da partitura fez-se, sim, mas apenas com uma indicação em Nota de Rodapé, onde se lê que a indicação mínima=semínima devia aparecer entre os compassos 6 e 7 e que esta mudança de tempo nos compassos 7-12 e 22-83 é feita pelo próprio Debussy - por exemplo em edições mais recentes da Durand ou da Dover - não se assumindo inteiramente a correcção do texto com base na performance. Sendo certa a insuficiência da escrita, seja qual for a linguagem utilizada, para transformar intenções em símbolos de forma completamente satisfatória e fidedigna, é sobre ela que assenta toda uma tradição de conhecimento e saber, e talvez por isso ocupe um lugar intocável no conceito de obra musical.

Continuum



György Ligeti, Continuum [1968]

Pequenos "senhores"

Hoje, os pequenos tornaram-se senhores: todos pregam a resignação e a modéstia e a prudência, e a aplicação, e as considerações, e as virtudes pacatas.


Friedrich Nietzsche, Assim falava Zaratustra

quinta-feira, 29 de março de 2007

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.


Fernando Pessoa

domingo, 25 de março de 2007

Texto (1)

A partitura musical não é uma múmia.
A essência da partitura consiste no texto criado pelo compositor no seu tempo e o executante, que pertence ao seu próprio tempo.
O segundo componente mudará sempre, e com ele, a essência da partitura musical.

Vitaly Margulis, Bagatelas, op.6

Palais de Mari

sexta-feira, 23 de março de 2007

"Remover"

Se desejar ser retirado da nossa lista de envio da Programação Casa da Música, por favor, responda a este e-mail com "Remover" em assunto.

Confesso que me tenho sentido tentado...
Esta programação deixa-me frequentemente mal disposto, bem, eu lá acabaria por saber mesmo que não por e-mail, porque afinal não se trata de ser ou não a casa de todas as músicas, mas sim, e apenas, de milhões de euros investidos em produtos que não justificam tantos "ões"!

Já não são questões só da CdM, da cidade do Porto (que tanto gosto mesmo com todos os dissabores), mas sim, deste Portugal! Um dia destes gostava de receber um e-mail com a seguinte proposta: "Se desejar ser retirado do nosso país à beira mar plantado, por favor, responda a este e-mail com "Remover" em assunto".

quinta-feira, 22 de março de 2007

+ colaboradores

Nesta fase de novo arranque o Tónica Dominante vai ter mais colaboradores.
Para já uma (Sónia A.)!
Em breve mais um e depois, logo se vê...

quarta-feira, 21 de março de 2007

Ensino "cada vez menos" Especializado da Música (7)


É também este um momento de retorno, o dos posts Ensino "muito pouco" Especializado da Música que desta feita ainda estão menos que "muito pouco", ou seja " cada vez menos"!
E o gato? Será um aluno supletivo? Ou um futuro aluno integrado? Não, se calhar é mas é um professor especializado!
Tanto faz, é tudo igual...
O gato é que não tem culpa.

sexta-feira, 16 de março de 2007

Textos para Nada

Apenas as palavras quebram o silêncio, todos os outros sons cessaram. Se eu estivesse silencioso, não ouviria nada. Mas se eu me mantivesse silencioso, os outros sons recomeçariam, aqueles a que as palavras me tornaram surdo, ou que realmente cessaram. Mas estou silencioso, por vezes acontece, não, nunca, nem um segundo.

Samuel Beckett, Textos para Nada

quinta-feira, 15 de março de 2007

Retorno

1 ano

Pois é...
Este blog faz agora um ano.
Por mais que não queira, estou um bocado cansado, o que é que querem, as pessoas fartam-se destas coisas...
Sou leitor assíduo de outros blogs (particularmente Bajja e Plasticina), isso sim, mas neste espaço, que é meu, começa a reinar o cansaço e algum desinteresse da minha parte.
Pergunto-me muitas vezes para que tenho eu um blog! Quanto se escreve ou se cita, pensamos (acho que não aspiramos a) ser lidos, e tal acto deve dar, no mínimo, algum gosto a quem lê. Tenho muitas dúvidas sobre se algumas (se não todas) das questões abordadas neste blog interessam a quem as lê. Este é um blog de música e pensei inicialmente (e inocentemente) que este seria lido essencialmente por músicos. Enganei-me!
Posso mesmo dizer que a maior parte dos músicos que conheço nunca leu um blog.
Preferem ler a Bola...
Apesar de achar que no futuro os blogs serão mais decisivos em termos de opinião do que a dita “informação oficial”, este não é ainda esse momento, pelo menos no caso específico da música. Como dizia um amigo que “arranjei” por estas andanças, o Tónica Dominante vai, assim, continuar por aqui, “boiando inerte”, até um dia voltar com mais força, ou pura e simplesmente, acabar.

Assim foi!
Escrevi isto em 6 / 2 /2006 e, desde aí, não saiu mais nada...
Então porquê voltar agora?
Não tenho resposta...
As minhas impressões sobre música e o seu estado em nada mudaram.
Pelo contrário! Só agravaram.
Penso que os futuros textos aqui publicados vão ser necessariamente (ainda) mais curtos, mais incisivos, mais lacónicos do que os da primeira versão do "Tónica Dominante".
Será porventura este um sinal de cansaço e defesa, deixar palavras curtas no ar, respostas sem perguntas, uma ou duas notas?
Possivelmente sim.