quarta-feira, 13 de abril de 2005

O fim da arte não é ser compreensível

Toda a arte é expressão de qualquer fenómeno psíquico. A arte, portanto, consiste na adequação, tão exacta quanto caiba na competência artística do fautor, da expressão à cousa que quer exprimir. De onde se deduz que todos os estilos são admissíveis, e que não há estilo simples nem complexo, nem estilo estranho nem vulgar.
Há ideias vulgares e ideias elevadas, há sensações simples e sensações complexas; e há criaturas que só têm ideias vulgares, e criaturas que muitas vezes têm ideias elevadas. Conforme a ideia, o estilo, a expressão. Não há para a arte critério exterior. O fim da arte não é ser compreensível, porque a arte não é a propaganda política ou imoral.

Fernando Pessoa, in ‘Sobre «Orpheu», Sensacionismo e Paùlismo
7 Comments:
At Segunda-feira, 18 Abril, 2005, Luís Aquino said...
Mmmm, não sei, não...
Que a arte seja a adequação da ideia à forma, de acordo. De que vale uma boa ideia sem uma boa forma? É uma vulgaridade. Mas uma ideia vulgar com uma forma, não apenas original, mas que prolongue e amplifique a primeira, passa ser arte.
Agora, que a arte não tenha que ser compreendida tem muito que se lhe diga e depende do registo semântico em que nos posicionarmos. Quero dizer: a arte faz sentido sem receptor? Não me parece. No mínimo, o próprio autor é o receptor. Então, isso implica comunicação. E como é que o autor comunica com o receptor, sem que haja algum tipo de ‘compreensão’ por parte deste? Por outro lado, Pessoa contradiz-se: se para ser arte, a forma e a ideia devem adequar-se, como avaliar essa adequação (logo reconhecer um objecto artístico) se não detectarmos que intencionalidade de comunicação teve o autor? Claro que apreciar arte não é saber traduzir em discurso verbal o que ela significa. Se é isso que Pessoa queria dizer, concordo. Até porque é difícil explicar uma realização artística; e , frequentemente, a explicação mata a obra. Se , por «compreender», ele quer dizer, «ser capaz de a descodificar com ferramentas de outra linguagem que não a nativa do objecto artístico», concordo.
Mas apreciar arte, digo eu, implica termos percepção (algum tipo de percepção, ainda que indefinível intelectualmente) da intencionalidade do autor, isto é, aquilo que torna aquele objecto artístico singular, que faça alguma diferença.
Que essa diferença seja dada mais pela forma do que pela ideia, pouco importa, até porque é difícil definir a fronteira entre uma e outra. Relendo agora o post, ocorre-me que o que terá levado o autor do Orpheu a fazer aquela afirmação terá sido mais marcar uma posição em relação às correntes mais conservadoras do início do século e não no sentido em que eu fiz o comentário. Mas não resisti a fazê-lo, sobretudo para sublinhar esta ideia: ao fazer arte comunica-se, quer o autor queira ou não (mas ele quer...)

At Segunda-feira, 18 Abril, 2005, Patrícia said...
Pois...pois....
O q queres sei eu... eh!eh!
A sério, agora.
Concordo. Nu fundo, a compreensão não é só racional. a comunicação está sempre lá.
Seu palhaço... (é a continuação...)

At Terça-feira, 19 Abril, 2005, sasfa said...
Olha lá, ó jornalista, não sabes que o artista é um ser egoísta?! O seu objectivo, e simultaneamente o seu verdadeiro drama, é encontrar a forma certa, mais fiel à ideia, aquela que se aproxime mais da sua verdade.O artista quer é exprimir(-se), mais do que comunicar... E já é tarefa que chegue!

At Terça-feira, 19 Abril, 2005, pb said...
Mau!
Mas tu queres ver que os comments do meu blogue estão a ficar mais interessantes do que os posts! É que, a continuar assim, qualquer dia deixo lá a cena dos posts e passo só a fazer comments! Mas esse teu comment, Sasfa, resume toda a questão, realmente exprimir já é difícil e ainda por cima querem comunicação!? Comprem um walkie talkie, ou quem sabe um aparelho de código morse!!!
:-P

At Terça-feira, 19 Abril, 2005, Patrícia said...
Mau, mau, Maria e já agora Manel....
Isto tá bonito, tá!
Mas afinal... em que ficamos?
O artista quer é exprimir-se pois claro, mas não está incutida a comunicação? porquê desvaloriza-la em relação ao “exprimir-se?” Há sempre comunicação e não vale a pena estar a discutir qual o intuito do artista. o que é importante é o q se sente: a pessoa q vê e que faz a obra. E mai nada!

At Terça-feira, 19 Abril, 2005, pb said...
Eu, para encerrar esta contenda, cito Schoenberg:
“Se é ARTE não é para as massas.
E se é para as massas não é ARTE*”.
Carta a William S. Schlamm - Los Angeles, 26 de Junho de 1945

At Terça-feira, 19 Abril, 2005, Luís aquino said...
Engraçado... eu pensava que exprimir implicava comunicar (mesmo que involuntariamente)! Mas se calhar não...se calhar exprimir vem de espremer... Enfim , tudo é possível.

Mas que importância tem isso? O importante é já saiu fumo branco da capela Sistina e o mundo já não está perdido porque o Ratzinger vai colocar tudo nos eixos. Ainda bem que o Pessoa já não é vivo, nem o amiguinho dele, o Almada, porque senão as futurices deles estavam feitas com o vaticano: o regresso das cruzadas está iminente.

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